Tuesday, September 16, 2008

O toureio a pé no feminino

Nasci em Lisboa, no entanto o sangue que me corre nas veias é ribatejano. É uma pura invenção cultural, mas dá-me prazer sentir-me como tal. Deste modo e não negando o que sinto, muito embora não seja uma aficionada, aprecio a tourada à portuguesa.
Este fim-de-semana que passou decorreu na "minha terra" (Golegã) a 10.ª Mostra de Gastronomia Ribatejana e o 2.º Salão do Vinho, do Vinagre e do Azeite do Ribatejo. Desde as primeiras realizações que se encontram integradas nesta feira as largadas de toiros e as picarias. Estes são dois momentos que considero bem demonstrativos do que é ser ribatejano. Passo a demonstrar o porquê:
  • Na sexta-feira a demonstração dos alunos da Escola de Toureio de José Falcão estava marcada para as 22h00m e iniciou pelas 23h15m, mas ninguém arredou pé! O Arneiro estava cheio, com pessoas em cima dos atrelados, nas bancadas e em pé junto às varas, aguentando o que fosse necessário para ver os toiros sair dos curros e percorrer a arena improvisada;
  • Na mesma sexta feira fez um frio de rachar, temperatura normal para esta zona do Vale do Tejo. No entanto, mesmo "rapando" frio, as pessoas se mantiveram à espera que os toiros e os corajosos mostrassem o quanto valem;
  • Neste mesmo dia os alunos da Escola de Toureio de José Falcão fizeram a sua demonstração com bezerros e novilhos (mais bezerros que novilhos), destacando-se a postura de uma toureira a pé, que mostrou ter tanta garra quanto os homens, bem como um gaiato que deu show; com cerca de 8 anos o rapaz toureou um bezerro que não devia ter mais de uns nove meses e no fim agarrou o microfone afirmando ir cantar um "fado ribatejano". A estas demonstração e não esquecer uma rapariga entre os forcadinhos que pegaram os bezerros;
  • No sábado repetiu-se o acto, desta vez marcado à mesma hora mas com espera até às 00h10m. Ninguém arredou pé! Muito embora estivesse a decorrer folclore num palco improvisado, a população "pedia tourada";
  • Nesta mesma madrugada ouviram-se olés e pegaram-se vaquinhas, tendo sido dada a possibilidade das crianças que se encontravam a assistir confrontarem-se na arena com um bezerrito com cerca de seis ou sete meses.
Ali naquela arena de toiros e humanos, não conseguindo alhear-me de realizar uma análise social, conclui que os presentes procuraram cultivar algo de comportamento marialva, um símbolo de nobreza ligado aos toiros e à vida boémia dos forcados. E, muito embora, não me sinta em condições de realizar uma auto-análise, questiono se eu própria não cultivei essa forma comportamental, pois afirmo que naquele palco senti orgulho em ser ribatejana.

P.S.: Não vale a pena me confrontarem com a questão do massacre dos toiros, porque gostos não se discutem. É algo que tem sido por mim cultivado, quer por imposição social (por quem me rodeia) quer por gosto próprio.

2 Comments:

Anonymous Anonymous said...

É de antropologia e acha que gostos não se discutem? Curioso. Relativamente à parte de considerar um "gosto" torturar animais, ao mesmo tempo que reconhece que práticas semelhantes só podem ser sustentadas por uma posição acrítica, nada a comentar.

4:47 AM  
Blogger Nuno said...

Oi Ana,

Isso de gostos não se discutem para um espectáculo de tortura...tem que se lhe diga. Ainda bem que a cultura romana não prevaleceu até hoje, ou então os espectáculos de gladiadores com animais seriam um must!
É errado, inútil e ignorante fazer-se touradas ou qualquer espectáculo que inclua sofrimento...não é culturalmente, socialmente, politicamente e outros mente aceitáveis e essa questão de tradição...acaba-se!
Imposição social?! Presumo que se vivesses antes do 25 de Abril serias...e no tempo da 2º Guerra Mundial na Alemanha...ui que susto! e não me venhas dizer que é diferente! Sâo imposições sociais!

Bom estudo.

Nuno

11:04 AM  

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